A INTOLERÂNCIA BURGUESA À CULTURA DOS EXCLUÍDOS SOCIAIS


O samba sempre enfrentou, resistiu e venceu as manifestações das mais diversas forças contrárias, que motivadas por sentimentos de discriminação e preconceito, sejam de natureza racial ou social, buscaram impedir sua classificação ou consideração como ato ou ação cultural.

Ao longo da história, as elites sempre tentaram colocar o samba em uma condição subalterna às demais manifestações musicais e culturais. Seus agentes, geralmente negros, pobres, miscigenados, desfavorecidos, excluídos socialmente, sentiram na carne as consequências de tamanha discriminação.

Vejamos um trecho do “Dossiê das Matrizes do Samba no Rio de Janeiro”, objeto de pesquisa de Helena Theodoro (doutora em filosofia e mestre em educação), Aloy Jupiara (jornalista) e Rachel Valença (filóloga, jornalista e mestre em língua portuguesa), coordenado POR Nilcemar Nogueira (mestre em bens culturais e projetos sociais), supervisionado e financiado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e também pelo Ministério da Cultura, e que foi realizado entre janeiro e outubro de 2006:

“...No começo do século XX, comunidades negras do Rio de Janeiro “excluídas de participação plena nos processos produtivos e políticos formais, persegui-das e impedidas de celebrar abertamente suas folias e sua fé “ deram forma a um novo samba, diferente dos tipos então conhecidos, que viria a ser chamado de samba urbano, samba carioca, samba de morro ou
simplesmente samba. Elas também criaram as escolas de samba, espaços de reunião, troca de experiências, estabelecimento de redes de solidariedade, criação artística e festa.

Essas comunidades, duramente atingidas pela reforma urbana da primeira década do século, que as afastou do Centro, resistiram e responderam à exclusão e ao preconceito, dentre outras maneiras, através do samba e das escolas, expressões populares de alto valor artístico e grande poder de integração. O samba foi e é um meio de comunicar experiências e demandas, individuais e de grupo; a escola de samba, nos terreiros/quadras e em seu momento maior, o desfile, que inicialmente se dava na Praça Onze, foi e é um exercício de política social ao levar os sambistas a reocupar as ruas, num processo de conquista e afirmação social que, embora avançando, ainda não foi concluído...”

Cito como exemplo uma canção interpretada pelo “hoje” célebre artista Zeca Pagodinho, pois seu surgimento se deu no tempo que o samba ainda era discriminado, e que bem traduz o tamanho do preconceito ao samba no passado:
 “Delegado Chico Palha / Sem alma ,sem coração / Não quer samba nem curimba / Na sua jurisdição / Ele não prendia / Só batia... / Os malandros da Portela / Da serrinha e da congonha / Pra ele eram  vagabundos / E as mulheres sem-vergonha...”
Se este Chico Palha existiu, ninguém sabe. Mas que a história narrada pela música, que é de 1938, tem correlação com a realidade da época, é inegável.
Tem gente querendo dar uma de Delegado Chico Palha em Campos, no que se refere às agremiações carnavalescas locais e ao Campos Folia 2014. Infelizmente, há pessoas demonstrando que a cultura é uma jurisdição e que as suas mais variadas formas de manifestação, realização ou execução pelo poder público deve obedecer aos seus preceitos e conceitos de gosto e qualidade.
Assim como o delegado Chico Palha, que não prendia (até porque pra prender tem de haver cominação legal), ele batia, a exemplo do escárnio público a que estão tentando submeter os gestores da cultura de Campos.
A grande verdade que tentam diariamente vender, além de supositiva, irresponsável, improvável e ilativa, é fantasiosa e nela estão travestidos seus reais princípios e propósitos. Tal como os falsos profetas usam o nome de Deus para “correr a sacolinha” e arrecadar dinheiro, estes usam o nome do povo para justificar seu real interesse: obter êxito político eleitoral, que tenha como resultado o desfavor nas urnas daqueles que atualmente fazem parte do grupo político situacionista na cidade.
*Escrito pelo jornalista André Freitas em seu blog (AQUI
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